terça-feira, agosto 07, 2007

A CHEGADA DE ACM NO INFERNO - LITERATURA DE CORDEL*



I
Numa sessão em Angola,
O meu amigo Raimundo

Recebeu alma penada
Que num contar bem profundo

Narrou a fundo a chegada
De ACM no outro mundo.

II

Todo vestido de branco,
Pois já tinha trocado o terno,

ACM se postou
Na entrada do inferno

Para onde foi direto
A mando do Pai Eterno.

III

Carregando água de cheiro,
Viu-se um cordão de baianas

Esperando o grande líder
Numa comitiva bacana

Com mais de 100 deputados
E um cão comendo bananas.

IV

Apareceu Lúcifer:
Com um chicote na mão

E a cara muito amarrada,
Foi logo dizendo, então,

Que entre o babalaô,
Hoje tem reunião.

V

Duma grande mesa de ferro
Já foram se aproximando.

Na cabeceira da mesa,
ACM foi sentando;

Lúcifer deu um pinote
E começou protestando:

VI

Aqui, quem manda sou eu,
Eu sou o rei da folia!

Pra comer acarajé
Tem de pedir à minha tia.

Já falei pra Juraci
Que aqui não é a Bahia!

VII

ACM não falou
Durante a reunião,

Fingiu concordar com tudo
Que viu na resolução,

Disse: "Tou com Lúcifer,
Vou apertar sua mão".

VIII

Junto com seis senadores
Começou a passear,

A cumprimentar o povo
Que encontrou no lugar,

Nas esquinas do Inferno
Desandou a discursar.

IX

Lúcifer tava dormindo,
Acordou de supetão,

Pela brecha da janela
Viu muita aglomeração

E ao redor de ACM
Toda espécie de cão.

X

"O Inferno está sem graça";
queremos animação;

"Lúcifer é um moleza,
Não rouba nem tem ação"

Assim pediam nas faixas
Do diabo a deposição.

XI

Lúcifer inda propôs
Dois turnos de eleição,

ACM fincou pé
Que não aceitava, não,

Pois à vontade do povo
Pedia deposição.

XII

Lúcifer sai correndo,
Pulou um grande portão,

Encontrou do outro lado
Seu amigo Lampião.

Disse: "O homem tá com a gota,
Quer fazer revolução!"

XIII

A hora é de resistir –
Exclamou Chico Pinguelo.

Vamos botar pra feder –
Animou-se João Tranguelo.

ACM hoje vai ver
Como se come farelo!

XIV

Aí, começou uma guerra
(Cacete de cão com cão):

A turma de ACM
Deitou abaixo o portão,

Tinha até uma quitandeira
Com uma vassoura na mão.

XV

No exército de ACM
Se viam até generais;

Lúcifer tinha cangaceiros
Que não acabavam mais

Pra defender o portão,
Reduto de Satanás.

XVI

O grande Lucas da Feira
Se agarrou com Pinochet,

Arrancou o seu bigode
Com uma agulha de crochê,

Deu uma facada em Videla,
Botou Médici pra correr.

XVII

O Cão-Coxo de um pinote
Uma tora de pau pegou,

Zuniu a tora no vento
Chega a direção mudou,

Meteu em Garrastazu, a tora pegou no sul
Que o norte sentiu a dor.

XVIII

ACM quase morre
Na volta de Cão-Ligeiro,

Escapou manco de uma perna
Por dentro do marmeleiro,

Escoltado por uma diaba
Com um pau de bater tempero.

XIX

Corisco acertou um tiro
No general Golbery;

Castelo Branco, com medo,
Começou fazer xixi;

Lampião disse só falta
Do nosso lado Waldir.

XX

Apareceu Costa e Silva,
Sem saber por quem lutava;

Ernesto Geisel num canto
Com Figueiredo falava,

Enquanto o Cabeça Branca
Na capoeira escapava.

XXI

Se mandou em retirada,
Pegou o caminho do Céu,

Deu um esbregue em São Pedro,
Uma bicuda em São Miguel

E ainda pirraçou
O arcanjo Gabriel.

XXII

Na porta do paraíso
Quando ACM chegou,

Ofegante e agitado,
A santidade esnobou

E disse para São Pedro:
Não falo com assessor

XXIII

Mandaram chamar Jesus
(Quem chamou foi São Tomé),

ACM se exaltou,
Fez o maior rapapé:

Eu só falo é com o pai dele,
Daqui não arredo pé!


XXIV

Jesus Cristo então pediu
O parecer de Maria.

Ela pensou direitinho
Enquanto o Inferno ardia:

Se o Inferno não agüenta,
Se aqui ele não entra,
Só voltando pra Bahia.

LITERATURA DE CORDEL* - tipo de poesia popular, originalmente oral, e depois impressa em folhetos rústicos expostos para venda pendurados em cordas ou cordéis, o que deu origem ao nome. São escritos em forma rimada e alguns poemas são ilustrados com xilogravuras, o mesmo estilo de gravura usado nas capas. As estrofes mais comuns são as de dez, oito ou seis versos. Os autores, ou cordelistas, recitam esses versos de forma melodiosa e cadenciada, acompanhados de viola.

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