quinta-feira, junho 04, 2009

Religião & Literatura - O Significado do Sangue

Por Bàbá Orlando d'Ògún Dímòlòkò*

O Culto de Orixá é composto de vários elementos, e apesar das pessoas acharem que o sangue é o principal deles, não é — a água é o principal elemento do Culto.“Criticar acadêmico quando se é ignorante (no sentido de ignorar) é uma coisa esquisita e até antiética, compreendo.

”Porém, em certas situações não podemos deixar de fazê-lo, principalmente, quando uma informação falsa é absorvida de modo espetacular pelo povo. A questão aqui, é sangue: preto, vermelho e branco.

— Se o galo, o pombo ou o bode é preto, a natureza do seu sangue é tido como preto para fins de ritual, ou seja:— Se o animal é vermelho, a natureza do sangue é vermelha,

— Se o animal é branco, a natureza do sangue é branca;— Se o animal é carijó, a natureza do sangue é preta e branca.Esta é a visão tradicional mesmo. Ifá diz: “ as características do ser estão no sangue”. É uma questão genética, pois se a cabra é vermelha e branca, o sangue é vermelho e branco.Acrescentar filosofia a isso, não acrescenta nada ao culto, só confunde. Das folhas só podemos extrair o sumo ou clorofila. Poderosas, acalmam, enlouquecem, curam ou matam — mas são folhas e não têm sangue!

— Os metais como ouro, cobre, bronze, ferro ou prata (preto, vermelho e branco), são vistos pelo povo da tradição como “excrementos” da Mãe Terra — também não têm sangue!—As bebidas nada mais são que combustíveis que dão energia para que haja a propulsão e o axé alcance o fim proposto, o comando necessário para aquilo que estamos empreendendo.

Para se entender melhor a questão do uso do gim no ritual é preciso entrar no campo da física, pois através do espargir da bebida sobre um ojubó, altar, se cria um campo energético (eletrons e prótons), onde a nossa palavra é acoplada para viajar dentro de um universo infinito, cujo som jamais se dissolverá, aí, nem a respiração se perde, pois a respiração do sacerdote passa a ser a respiração do próprio universo contida no micro-cosmo.

— Se a água é sangue, porque não se faz Oxalá com água e cachaça (sêmen), já que ele não aceita o sangue vermelho; mas espertos, dizem que a cabra de Oxalá é branca, o que encerra o significado da questão genética.

Para encerrarmos esse assunto, devemos entender que as qualidades do sangue, são inerentes à qualidade do animal que oferecemos, tomando-se o cuidado de oferecer apenas animais perfeitos, isso basta, o resto são apenas conceitos.

— Não devemos deixar de frisar que não sendo o culto fundamentalista e sim tradicionalista, para tudo há sempre outras opções, pois o maior erro cometido no culto de Orixá, é o surgimento de pessoas que de fora apenas observam e põem no papel aquilo que acham, acrescentando a isso sua visão pessoal.

— Na medicina do Culto as folhas são usadas não somente como remédios, mas também, transformadas em pós, àgúnmu, que são verdadeiros antivírus, em àgbo, maceração vegetal, usado em banhos rituais, para consagrar objetos do Culto, e delas, nada se perde, pois os “bagaços” podem ser usados em outras finalidades...

— Já o mel, produto do néctar colhido das flores pelas abelhas, nada tem a ver com sangue, pois é o símbolo da discrição, dentro do culto não é utilizado para adoçar e sim guardar segredos, isso ocorre porque a doçura do mel faz com que qualquer um que o coloque na boca não salive com piedade, nem diga que é amargo; simplesmente que é gostoso, assim, não tem o sentido de doçura e sim de adoçar..., formar comunidades ou grupos sociais, de acordo com a organização social das abelhas, união, aqui também entra a questão da transmissão genética e de transmissão ancestral. O grifo é nosso!

— O epo-pupa, azeite de dendê, é o mais mal entendido dos elementos de axé, pois utilizado pela maioria das pessoas como elemento que excita, na verdade é elemento apaziguador, porque é eró, calmante. Tomemos como exemplo o fogo, pois se colocarmos umas gotinhas de dendê o fogo aumenta, mas se for muita quantidade, o fogo apaga, ou seja, apazigua. Logo se o seu desejo é manter Exu apaziguado o conceito é este.

— Na música a maior expressão se encontra no som do agogo-ãgo, sino, e não nos atabaques, Ilu, cujo meio tom da marcação do ritmo, promove a manifestação da Divindade acoplada no homem. Logo não cabe, nesse sentido, dar ao Culto alcunha pejorativa de animismo, pois animação vem de ânimo (alma), acendimento, entusiasmo, coragem ou força; e não significa de modo algum, dar vida a objetos inanimados através dos rituais.

— Quando o assunto é sacrifício de frutos, o fruto mais importe é o Obì. Isso porque o conceito é de semeadura, o que significa que frutas que não dão sementes não servem para sacrifícios. Nesse sentido Obì já aparece como semente, por ser “Ele” um fruto que brota de si mesmo — ou seja, é completo.

Fonte: Bàbá Orlando d'Ògún Dímòlòkò* Iniciado em Ifá, Òrísà Ògún e Egúngún, Sacerdote do Ilé Àse Lóde Ògún Egbé Omo Òdúwà. Autor de 6 livros, a saber:Rezas para os Orixás, Orunmilá e Exú, Candomblé Ritual e Tradição, Ebó no Culto aos Orixás, Aprende Ìyáwó e Kó-Lèkó Ìyáwó, Vol. I - Èsù-Sìgidi. http://ogundimoloko.blogspot.com/

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